O que vem por ai - A MENINA QUE QUERIA SER ESTRELA
Voltado para o público infanto juvenil, “A Menina que Queria Ser Estrela” surge como fruto de um trabalho de pesquisa dos jovens atores Brenda Perim e Marco Antônio Reis. Ambos assinam o texto e a direção da peça, são integrantes da Cia. Nós de Teatro e estudantes do 5º período de Artes Cênicas da Universidade de Vila Velha (UVV).
O espetáculo faz referência a uma série de mitos do folclore brasileiro, alguns conhecidos e outros nem tanto, como o do “Capelobo”, do “Sanguanel”, do “Japim”, do “Boto Cor de Rosa” e o da “Vitória Régia”, no qual a história central é livremente inspirada. A peça, que é uma realização da Cia. Nós de Teatro em parceria com o Grupo de Pesquisa do Curso de Artes Cênicas da UVV “Poéticas da Cena Contemporânea”, tem estreia marcada para 25 de agosto em Cachoeiro de Itapemirim - informações no final da entrevista.
Para conhecer mais sobre a pesquisa e o processo de montagem do espetáculo, confira a entrevista abaixo com Brenda Perim, a segunda da série “O que vem por aí”, que aborda as estreias teatrais de 2017 e tem o objetivo de informar, com um pouco mais de profundidade, sobre o que tem sido produzido no Espírito Santo, além de ampliar o espaço de divulgação sobre o fazer teatral local. A série é promovida pelo Blog Cena Capixaba em parceria com a atriz e jornalista Patricia Galleto.
Como surgiu a ideia do trabalho?
A gente começou com duas pesquisas de iniciação científica, que são a minha e a do Marco. Dentro do curso de Artes Cênicas, há um edital em que você propõe uma pesquisa de iniciação científica, a gente se inscreveu e passou. Foi a segunda vez, na primeira, a gente montou o espetáculo “As Criadas”. Dessa vez, o Marco iria trabalhar outra coisa e esse projeto seria mais direcionado para a minha pesquisa. Eu optei por trabalhar o infanto-juvenil. Eu só tinha montado uma vez uma peça infantil em Cachoeiro, quando meu conhecimento era bem menor. Depois de um tempo, a gente decidiu juntar as duas pesquisas em prol de uma montagem, também para aprofundarmos mais nossas investigações.
Qual foi o ponto de partida?
Inicialmente, a gente leu muito dramaturgia infantil, tentando entender a dramaturgia infantil e também tentando escolher um texto, porque nossa ideia não era escrever. De setembro a dezembro, só lemos e experimentamos, em cena, algumas proposições a partir dos procedimentos do Marco, que está investigando sobre o corpo, e dos meus procedimentos relacionados à voz. A gente estudava e pegava algumas ações específicas, por exemplo, as coisas mais engraçadas, por que elas eram mais engraçadas? A relação com os animais também era muito forte, havia muitas dramaturgias com animais, apontando para um espaço mais lúdico para a criação.
Por fim, a gente decidiu criar uma dramaturgia própria sobre o folclore. Pesquisamos bastante sobre o folclore brasileiro e decidimos pegar lendas pouco conhecidas - dentro do espetáculo, temos a do Capelobo, Sanguanel, Japim, a Vitória Régia, que é um pouco mais conhecida, assim como a do Boto Cor de Rosa - e mesclar com outros elementos.
Outra coisa que a gente fez foi estudar visualmente espetáculos infantis mais pós-dramáticos, que não trabalham muito com a dramaturgia, percebendo esses elementos visuais. As cenas começaram a ser criadas na sala de ensaio, a gente jogou jogo de RPG também para criar algumas falas, muitas coisas surgiram. Eu e Marco, nas férias, reunimos todo esse material e redigimos o texto. Algumas coisas novas surgiram enquanto a gente escrevia, outras foram coisas que realmente surgiram em cena ou no jogo de RPG, outras eram proposições dos próprios atores. No elenco, estão o Leonardo Dariva, a Sami Gotto, o João Mendes e o Marco Antônio Reis, que também faz algumas participações.
Em fevereiro, já começamos a trabalhar em cima do texto, mas demoramos um tempo para descobrir qual seria a linguagem do espetáculo.
E qual é a linguagem do espetáculo?
Agora é que a gente está começando a descobrir, a gente pensa que ela tem muito jogo corporal. Eu tenho primas entre 3 e 7 anos para quem eu levo os vídeos dos ensaios e vou perguntando. Com cenas que eram mais corporais, elas se entretinham mais e ficavam mais concentradas, queriam ver de novo, então a gente falava “olha, isso é interessante”. Outras que tinham mais texto, elas achavam chato. A gente ia levando alguns pontos que as minhas primas iam falando e ia estudando isso.
Agora, o espetáculo começou a se estruturar com mais de uma linguagem; a gente tem sombra, tem personagens que não são literais (se você olha para ele, você não o identifica de primeira). A voz, às vezes, aparece como complemento e diz alguma coisa desse personagem, o próprio texto, a imagem. A nossa lua, por exemplo, é feita de um guarda-chuva coberto de espelhos. São objetos, cores, elementos que vão dando pistas de como são essas criaturas.
Como essa busca pela linguagem dialoga com as pesquisas que vocês desenvolvem?
A minha pesquisa é em Voz Extracotidiana e a do Marco é um procedimento que ele está desenvolvendo a partir de outro procedimento, que é o Campo de Visão, do Marcelo Lazzaratto, de São Paulo. A minha investigação é da voz não naturalista, em que eu pesquiso jogos da voz, metodologias para a voz, como manter essa voz extracotidiana, porque, dentro da pesquisa de “As Criadas”, a gente percebeu que surgia uma voz potente, que era muito boa, mas que, na cena, ela se diluía com o tempo. A pesquisa aborda isso também.
Já o procedimento do Marco é muito corporal, muito dilatado, muito extracotidiano. É bem marcado e, de alguma forma, funciona com a criança. Então a gente tenta equilibrar entre momentos de silêncio, com pouco movimento, e outros mais acrobáticos. Estamos descobrindo ainda, na verdade. Mas, agora, já estamos mais direcionados para a cena.
Na minha pesquisa relacionada à voz, eu trabalho com a desvinculação de voz e personagem. A voz da lua, por exemplo, que está em cena, vem de fora, de outros atores. É uma pesquisa sobre como a voz de fora interfere no corpo da lua, que é um ator que manuseia esse guarda-chuva. Também há alguns animais, que são feitos com as vozes dos atores em cena, que é quando a gente assume o ator em cena fazendo essas vozes.
Dentro da própria pesquisa, nós também trabalhamos com o “efeito monstro”. É uma construção que não parte só do ator, mas também de materiais de vários lugares e junta tudo, como um Frankenstein: uma orelha daqui, um braço dali etc. A gente trabalha com essas vozes nos personagens, por exemplo, em contradição - quando ele é mais bonzinho com a menina, ele está com uma voz mais brava, de desenhos animados, de filmes, e etc. A gente pega essas vozes, tenta trazê-las para o corpo e trabalhar esse efeito monstro, que é uma espécie de colagem de vozes. Trabalhamos, ainda, com recursos de dublagem para a criação, em que os atores viam as imagens e, com o estímulo visual, traziam a voz, sem ter o personagem ainda definido. A voz não nascia para ele, a gente encaixava as duas coisas depois.
Quanto à história, como vocês costuraram os elementos folclóricos de diferentes regiões?
A gente pensa nesse universo onde existem todas essas criaturas e essa menina. A história é a de uma menina que quer se tornar estrela, que, na verdade, é a história da Vitória-Régia. A Vitória-Régia é uma índia (embora a gente não coloque a personagem como índia; colocamos só como uma menina), ela é uma índia que quer virar estrela porque é apaixonada pela lua e, se tornando uma estrela, ela poderia ficar mais próxima da lua. Só que, na história real, ela vê o reflexo da lua em um lago, mergulha e se afoga. Aí a lua, com pena dela, a transforma em Vitória-Régia, que é a estrela da água. A gente relaciona a narrativa com isso. Na nossa história, ela tem que realizar algumas tarefas para a lua para, então, conseguir virar estrela. As tarefas são encontrar alguns animais que foram capturados ou estão em perigo. Alguns desses animais e seres que ajudam a menina são seres mitológicos.
Outros elementos do espetáculo, como cenário, figurino, trilha, também são vocês mesmos que estão desenvolvendo?
Sim, tudo. É meio desesperador (risos). Os atores também participam das decisões e da construção. A Sami, por exemplo, é quem passa tudo para o papel sobre nossas ideias e referências de figurino porque ela desenha muito bem, enquanto o Mário, que trabalha na Produção, dá uma arrematada, pensa nas possibilidades de tecido etc., e a gente costura.
Também fizemos parceria com o pessoal do curso de Música da Ufes porque, já que estamos primando pelo texto e por tudo ser nosso, que a música também seja! Então a gente conversou com eles, demos algumas referências e eles vão compor para o espetáculo, tanto a trilha de ambientação, de personagem, quanto as duas músicas com letras.
O trabalho tem orientação de algum professor?
A gente tem a orientadora de pesquisa, que é a Rejane Arruda. O espetáculo vem como um produto da pesquisa, mas a orientação não é direcionada para ele. Ele é um projeto de extensão da UVV, produzido pela Cia. Nós de Teatro. No ensaio aberto que fizemos, tivemos a oportunidade de ter um retorno do público e dos outros professores também, que, nesse caso, foi direcionado mais para o espetáculo mesmo.
Ao longo dessas experimentações e descobertas, de modo geral, o que vocês têm percebido como especificidades de um trabalho voltado para o público infanto juvenil nos tempos de hoje? Há algum tipo de cuidado especial?
A gente caiu e continua caindo em vários impasses. Um deles é o cuidado que a gente deve e também não deve ter com esse público. A gente ouve muito “ah, mas a criança não vai entender isso”, e não querermos cair nesse discurso, não queremos subestimar a criança. Outra questão é pensar nessa capacidade da criança e no desenvolvimento cognitivo dela, então não levamos nada pronto. A nossa lua, por exemplo, não é uma bola para a qual você olha e vê, imediatamente, que é uma lua, a gente pensa em como estimular essa criança. Nos ensaios, uma vez, a gente fez essa cena com um guarda-chuva vermelho porque era o que a gente tinha, eu filmei e mostrei para minha prima pequena, e ela disse: “Olha, que lindo! É o sol!”. Pensamos em como estimular a criança e o adolescente a criar junto com a gente, por isso, temos esses personagens que não são construídos por inteiro, e a dramaturgia, que tem pontos onde eles podem continuar a criar.
Também caímos em um impasse de qual é a idade da menina que quer virar estrela e, por um tempo, a gente pensou em ela ser mais jovem, depois, em ela ser mais velha. No momento, a gente acha que ela não tem uma idade porque ela pode gerar identificação tanto em uma criança de seis anos quanto em uma de doze, ou até no pai que está acompanhando, porque o texto tem espaços para isso.
A partir disso, também começou a surgir outro projeto que começamos a fazer em parceria com o pessoal de publicidade da UVV, dentro do projeto chamado Inova Social, que é um livro interativo, também buscando essa proposta em que as coisas não estão prontas e o público-espectador-leitor pode criar.
A montagem do espetáculo, então, já tem se desdobrado em novos projetos… Qual é a proposta do livro? E há outras frentes de trabalho?
O livro traz a história da menina que queria ser estrela, é interativo e não linear. O leitor vai até certo ponto da história e escolhe para onde quer ir, se quer ir para esquerda, vai acontecer isso, se for para a direita, vai acontecer aquilo. São vários finais e o leitor decide qual ele quer. A ideia é fazer mais dois livros para formar uma coleção com três obras, completando a história da menina. Nas escolhas de atividades para as crianças, inclusive, a gente conversou com o pessoal da Educação Física e, então, para ajudar a menina a ser estrela, a criança tem que fazer uma atividade também, ou colorir etc. O livro está pronto, só que sem esses adicionais; está com a primeira parte interativa de escolhas literárias.
A partir do Inova, o projeto começou a ter mais camadas. Além do livro, queremos fazer com que a divulgação do espetáculo seja também um produto artístico. Não queremos divulgar só na internet e com panfletos, queremos, por exemplo, ir às escolas fazer contação de história dos mitos abordados no espetáculo. Se a criança não pode, por algum motivo, ir ao espetáculo, ela já vai ter acesso a algum produto e a parte dessa mitologia brasileira. E, no futuro, pensamos em fazer um documentário com todos esses formatos da história.
Para saber mais sobre o espetáculo e acompanhar o processo de montagem de “A Menina que Queria Ser Estrela”, acesse o blog http://a-menina-que-queria-ser-estrela.webnode.com/
A Menina que Queria Ser Estrela
Cia. Nós de Teatro e Grupo de Pesquisa “Poéticas da Cena Contemporânea” (Artes Cênicas UVV)
25 de agosto às 19:00
Teatro Rubem Braga
Cachoeiro de Itapemirim - ES
O espetáculo faz referência a uma série de mitos do folclore brasileiro, alguns conhecidos e outros nem tanto, como o do “Capelobo”, do “Sanguanel”, do “Japim”, do “Boto Cor de Rosa” e o da “Vitória Régia”, no qual a história central é livremente inspirada. A peça, que é uma realização da Cia. Nós de Teatro em parceria com o Grupo de Pesquisa do Curso de Artes Cênicas da UVV “Poéticas da Cena Contemporânea”, tem estreia marcada para 25 de agosto em Cachoeiro de Itapemirim - informações no final da entrevista.
Para conhecer mais sobre a pesquisa e o processo de montagem do espetáculo, confira a entrevista abaixo com Brenda Perim, a segunda da série “O que vem por aí”, que aborda as estreias teatrais de 2017 e tem o objetivo de informar, com um pouco mais de profundidade, sobre o que tem sido produzido no Espírito Santo, além de ampliar o espaço de divulgação sobre o fazer teatral local. A série é promovida pelo Blog Cena Capixaba em parceria com a atriz e jornalista Patricia Galleto.
Como surgiu a ideia do trabalho?
A gente começou com duas pesquisas de iniciação científica, que são a minha e a do Marco. Dentro do curso de Artes Cênicas, há um edital em que você propõe uma pesquisa de iniciação científica, a gente se inscreveu e passou. Foi a segunda vez, na primeira, a gente montou o espetáculo “As Criadas”. Dessa vez, o Marco iria trabalhar outra coisa e esse projeto seria mais direcionado para a minha pesquisa. Eu optei por trabalhar o infanto-juvenil. Eu só tinha montado uma vez uma peça infantil em Cachoeiro, quando meu conhecimento era bem menor. Depois de um tempo, a gente decidiu juntar as duas pesquisas em prol de uma montagem, também para aprofundarmos mais nossas investigações.
Qual foi o ponto de partida?
Inicialmente, a gente leu muito dramaturgia infantil, tentando entender a dramaturgia infantil e também tentando escolher um texto, porque nossa ideia não era escrever. De setembro a dezembro, só lemos e experimentamos, em cena, algumas proposições a partir dos procedimentos do Marco, que está investigando sobre o corpo, e dos meus procedimentos relacionados à voz. A gente estudava e pegava algumas ações específicas, por exemplo, as coisas mais engraçadas, por que elas eram mais engraçadas? A relação com os animais também era muito forte, havia muitas dramaturgias com animais, apontando para um espaço mais lúdico para a criação.
Por fim, a gente decidiu criar uma dramaturgia própria sobre o folclore. Pesquisamos bastante sobre o folclore brasileiro e decidimos pegar lendas pouco conhecidas - dentro do espetáculo, temos a do Capelobo, Sanguanel, Japim, a Vitória Régia, que é um pouco mais conhecida, assim como a do Boto Cor de Rosa - e mesclar com outros elementos.
Outra coisa que a gente fez foi estudar visualmente espetáculos infantis mais pós-dramáticos, que não trabalham muito com a dramaturgia, percebendo esses elementos visuais. As cenas começaram a ser criadas na sala de ensaio, a gente jogou jogo de RPG também para criar algumas falas, muitas coisas surgiram. Eu e Marco, nas férias, reunimos todo esse material e redigimos o texto. Algumas coisas novas surgiram enquanto a gente escrevia, outras foram coisas que realmente surgiram em cena ou no jogo de RPG, outras eram proposições dos próprios atores. No elenco, estão o Leonardo Dariva, a Sami Gotto, o João Mendes e o Marco Antônio Reis, que também faz algumas participações.
Em fevereiro, já começamos a trabalhar em cima do texto, mas demoramos um tempo para descobrir qual seria a linguagem do espetáculo.
E qual é a linguagem do espetáculo?
Agora é que a gente está começando a descobrir, a gente pensa que ela tem muito jogo corporal. Eu tenho primas entre 3 e 7 anos para quem eu levo os vídeos dos ensaios e vou perguntando. Com cenas que eram mais corporais, elas se entretinham mais e ficavam mais concentradas, queriam ver de novo, então a gente falava “olha, isso é interessante”. Outras que tinham mais texto, elas achavam chato. A gente ia levando alguns pontos que as minhas primas iam falando e ia estudando isso.
Agora, o espetáculo começou a se estruturar com mais de uma linguagem; a gente tem sombra, tem personagens que não são literais (se você olha para ele, você não o identifica de primeira). A voz, às vezes, aparece como complemento e diz alguma coisa desse personagem, o próprio texto, a imagem. A nossa lua, por exemplo, é feita de um guarda-chuva coberto de espelhos. São objetos, cores, elementos que vão dando pistas de como são essas criaturas.
Como essa busca pela linguagem dialoga com as pesquisas que vocês desenvolvem?
A minha pesquisa é em Voz Extracotidiana e a do Marco é um procedimento que ele está desenvolvendo a partir de outro procedimento, que é o Campo de Visão, do Marcelo Lazzaratto, de São Paulo. A minha investigação é da voz não naturalista, em que eu pesquiso jogos da voz, metodologias para a voz, como manter essa voz extracotidiana, porque, dentro da pesquisa de “As Criadas”, a gente percebeu que surgia uma voz potente, que era muito boa, mas que, na cena, ela se diluía com o tempo. A pesquisa aborda isso também.
Já o procedimento do Marco é muito corporal, muito dilatado, muito extracotidiano. É bem marcado e, de alguma forma, funciona com a criança. Então a gente tenta equilibrar entre momentos de silêncio, com pouco movimento, e outros mais acrobáticos. Estamos descobrindo ainda, na verdade. Mas, agora, já estamos mais direcionados para a cena.
Na minha pesquisa relacionada à voz, eu trabalho com a desvinculação de voz e personagem. A voz da lua, por exemplo, que está em cena, vem de fora, de outros atores. É uma pesquisa sobre como a voz de fora interfere no corpo da lua, que é um ator que manuseia esse guarda-chuva. Também há alguns animais, que são feitos com as vozes dos atores em cena, que é quando a gente assume o ator em cena fazendo essas vozes.
Dentro da própria pesquisa, nós também trabalhamos com o “efeito monstro”. É uma construção que não parte só do ator, mas também de materiais de vários lugares e junta tudo, como um Frankenstein: uma orelha daqui, um braço dali etc. A gente trabalha com essas vozes nos personagens, por exemplo, em contradição - quando ele é mais bonzinho com a menina, ele está com uma voz mais brava, de desenhos animados, de filmes, e etc. A gente pega essas vozes, tenta trazê-las para o corpo e trabalhar esse efeito monstro, que é uma espécie de colagem de vozes. Trabalhamos, ainda, com recursos de dublagem para a criação, em que os atores viam as imagens e, com o estímulo visual, traziam a voz, sem ter o personagem ainda definido. A voz não nascia para ele, a gente encaixava as duas coisas depois.
Quanto à história, como vocês costuraram os elementos folclóricos de diferentes regiões?
A gente pensa nesse universo onde existem todas essas criaturas e essa menina. A história é a de uma menina que quer se tornar estrela, que, na verdade, é a história da Vitória-Régia. A Vitória-Régia é uma índia (embora a gente não coloque a personagem como índia; colocamos só como uma menina), ela é uma índia que quer virar estrela porque é apaixonada pela lua e, se tornando uma estrela, ela poderia ficar mais próxima da lua. Só que, na história real, ela vê o reflexo da lua em um lago, mergulha e se afoga. Aí a lua, com pena dela, a transforma em Vitória-Régia, que é a estrela da água. A gente relaciona a narrativa com isso. Na nossa história, ela tem que realizar algumas tarefas para a lua para, então, conseguir virar estrela. As tarefas são encontrar alguns animais que foram capturados ou estão em perigo. Alguns desses animais e seres que ajudam a menina são seres mitológicos.
Outros elementos do espetáculo, como cenário, figurino, trilha, também são vocês mesmos que estão desenvolvendo?
Sim, tudo. É meio desesperador (risos). Os atores também participam das decisões e da construção. A Sami, por exemplo, é quem passa tudo para o papel sobre nossas ideias e referências de figurino porque ela desenha muito bem, enquanto o Mário, que trabalha na Produção, dá uma arrematada, pensa nas possibilidades de tecido etc., e a gente costura.
Também fizemos parceria com o pessoal do curso de Música da Ufes porque, já que estamos primando pelo texto e por tudo ser nosso, que a música também seja! Então a gente conversou com eles, demos algumas referências e eles vão compor para o espetáculo, tanto a trilha de ambientação, de personagem, quanto as duas músicas com letras.
Fotos do Work-in-progress na 7ª Abertura de Processo de Criações Cênicas / PERFORMA-ES
O trabalho tem orientação de algum professor?
A gente tem a orientadora de pesquisa, que é a Rejane Arruda. O espetáculo vem como um produto da pesquisa, mas a orientação não é direcionada para ele. Ele é um projeto de extensão da UVV, produzido pela Cia. Nós de Teatro. No ensaio aberto que fizemos, tivemos a oportunidade de ter um retorno do público e dos outros professores também, que, nesse caso, foi direcionado mais para o espetáculo mesmo.
Ao longo dessas experimentações e descobertas, de modo geral, o que vocês têm percebido como especificidades de um trabalho voltado para o público infanto juvenil nos tempos de hoje? Há algum tipo de cuidado especial?
A gente caiu e continua caindo em vários impasses. Um deles é o cuidado que a gente deve e também não deve ter com esse público. A gente ouve muito “ah, mas a criança não vai entender isso”, e não querermos cair nesse discurso, não queremos subestimar a criança. Outra questão é pensar nessa capacidade da criança e no desenvolvimento cognitivo dela, então não levamos nada pronto. A nossa lua, por exemplo, não é uma bola para a qual você olha e vê, imediatamente, que é uma lua, a gente pensa em como estimular essa criança. Nos ensaios, uma vez, a gente fez essa cena com um guarda-chuva vermelho porque era o que a gente tinha, eu filmei e mostrei para minha prima pequena, e ela disse: “Olha, que lindo! É o sol!”. Pensamos em como estimular a criança e o adolescente a criar junto com a gente, por isso, temos esses personagens que não são construídos por inteiro, e a dramaturgia, que tem pontos onde eles podem continuar a criar.
Também caímos em um impasse de qual é a idade da menina que quer virar estrela e, por um tempo, a gente pensou em ela ser mais jovem, depois, em ela ser mais velha. No momento, a gente acha que ela não tem uma idade porque ela pode gerar identificação tanto em uma criança de seis anos quanto em uma de doze, ou até no pai que está acompanhando, porque o texto tem espaços para isso.
A partir disso, também começou a surgir outro projeto que começamos a fazer em parceria com o pessoal de publicidade da UVV, dentro do projeto chamado Inova Social, que é um livro interativo, também buscando essa proposta em que as coisas não estão prontas e o público-espectador-leitor pode criar.
A montagem do espetáculo, então, já tem se desdobrado em novos projetos… Qual é a proposta do livro? E há outras frentes de trabalho?
O livro traz a história da menina que queria ser estrela, é interativo e não linear. O leitor vai até certo ponto da história e escolhe para onde quer ir, se quer ir para esquerda, vai acontecer isso, se for para a direita, vai acontecer aquilo. São vários finais e o leitor decide qual ele quer. A ideia é fazer mais dois livros para formar uma coleção com três obras, completando a história da menina. Nas escolhas de atividades para as crianças, inclusive, a gente conversou com o pessoal da Educação Física e, então, para ajudar a menina a ser estrela, a criança tem que fazer uma atividade também, ou colorir etc. O livro está pronto, só que sem esses adicionais; está com a primeira parte interativa de escolhas literárias.
A partir do Inova, o projeto começou a ter mais camadas. Além do livro, queremos fazer com que a divulgação do espetáculo seja também um produto artístico. Não queremos divulgar só na internet e com panfletos, queremos, por exemplo, ir às escolas fazer contação de história dos mitos abordados no espetáculo. Se a criança não pode, por algum motivo, ir ao espetáculo, ela já vai ter acesso a algum produto e a parte dessa mitologia brasileira. E, no futuro, pensamos em fazer um documentário com todos esses formatos da história.
Para saber mais sobre o espetáculo e acompanhar o processo de montagem de “A Menina que Queria Ser Estrela”, acesse o blog http://a-menina-que-queria-ser-estrela.webnode.com/
A Menina que Queria Ser Estrela
Cia. Nós de Teatro e Grupo de Pesquisa “Poéticas da Cena Contemporânea” (Artes Cênicas UVV)
25 de agosto às 19:00
Teatro Rubem Braga
Cachoeiro de Itapemirim - ES
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